quinta-feira, 28 de julho de 2016

Nota sobre Maria

Maria vai bem, apesar de escondida. Às vezes some por meses, e depois volta. É sua ausência constante que mais me preocupa. Quase acredito que Maria morre aos poucos, que deixou a cidade pesada entrar no seu peito tão leve, que secou seus olhos que sempre foram úmidos.

Não sei até quando Maria vai bem. A verdade é que ando me esquecendo com frequência dela. E choro escondida quando lembro do meu esquecimento. E prometo nunca mais esquecer-me dela. Mas volto a esquecer. E ela volta a sumir. Logo ela, que sempre reinou. Que sempre esteve tão presente nos dias. Os dias, os dias que agora são esse emaranhado de preenchimentos.

Talvez seja isso: a consistência dos dias está apagando Maria. 

O pior de tudo isso não é o sumiço de Maria, é conseguir aceitar a sua provável e próxima inexistência. E ter de lidar com uma primeira pessoa do singular toda manchada de neuroses.

Não quero que Maria vá embora. Mas também não sei o que fazer pra ela ficar.