sexta-feira, 22 de julho de 2011

-As pessoas acham que são livres, mas desde que elas nascem estão presas. Liberdade? Que liberdade? Estamos presos à família, aos remédios, ao trabalho, à religião e à sociedade. De liberdade só a estátua da liberdade mesmo...

Cai um copo de cerveja no chão sujo do bar. Fim de cena. Ou pelo menos quase fim de cena.

sábado, 16 de julho de 2011

Dores acalmadas pelo toque crescente do som do silêncio
São estrelas cadentes inventadas que preenchem os olhos abandonados
E tristezas que se juntam e explodem em estradas escuras
Não dançam nem cantam nem criam amantes carentes

Sorrisos brancos forrados de cetim desbotado pelo sol de inverno
Insistem em viver, apesar da derrota que se faz cheirosa e vertiginosa
Estão nos bancos das praças mal-ilumidadas, no centro das vitórias
Proclamam desejos mortos, choram vidas passadas e caem sem graça

Bares com cheiro de fritura e música alta que fura os tímpanos
Caminho sorrateiramente na cidade grande manchada de naftalina
E a noite se faz doce e depois se mistura com o salgado do mar
Mas não há ondas nem céu, tampouco há o mar que é quase pó




Hoje te vi respirar, um suspiro que quase se transformou em canção e depois em soluço e depois em grito. Te disse que vi uma menina dançando balé, bem acima dos músicos da orquestra e ela estava triste, tão triste. Na música do Bach já não existia bailarina nem rosa nem a tentativa de uma alegria. Era só uma garota com cabelos encaracolados dançando deitada no chão. Ela fazia movimentos bruscos, nem tentava ser delicada. Tinha um vestido esvoaçante e estava em um palco de teatro, também acima dos músicos. Quando ela levantou do chão, uma poça de sangue vermelho escuro se destacou. E ela continuou dançando ao som da música clássica e desenhou, nas paredes brancas imaginárias, frases... desenhou frases com o seu próprio sangue. Paredes altas e secas cobertas por letras doentias. Se quebraram e esfarelaram e caíram como pó de sonho em cima da menina. Depois que ela morreu, veio o circo na continuação da música do Bach. Primeiro a mulher dos elefantes, toda triste com os pés pequenos. Depois a garota palhaça toda triste com a sua inutilidade, chorou lágrimas borradas pela tinta que cobria a face. Quando ela evaporou, veio a trapezista com seu corpo magrinho e voz tão baixa que era tachada de muda. E todas elas se perderam quando a orquestra parou de tocar e as luzes se acenderam e o público bateu palmas sem parar. E eu que nunca quis ser bailarina, nem outro tipo de dançarina, nem menina dos elefantes, nem palhaça nem trapezista. E eu, que nunca quis ser nada, não fico triste. E elas que eram algo sumiram com o vento da noite de quinta, cortaram o céu junto com os aviões que não param um segundo em solo, e agora pertencem a outro dos tantos mundos dentro desse mundo. Hoje eu te vi dormir e depois sonhei com geleiras. Ontem você me viu dormir e não conseguiu pegar no sono.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Não há mais vinho doce escondido no armário
Nem garrafas de cerveja quase vencidas na geladeira
Só existe o meu batom vermelho que você não gosta

Desculpe, esqueci de rimar

sexta-feira, 8 de julho de 2011

(...) eu queria te dizer uma porção de coisas, de uma porção de noites, ou tardes, ou manhãs, não importa a cor, é, a cor, o tempo é só uma questão de cor, não é?" Abreu

Às vezes te espero em finais de ruas amplas demais, com cores que mesclam e depois somem na noite. Às vezes te espero junto com as lágrimas sem gosto que acompanham os sorrisos tímidos e invisíveis. Espero você ligar ou colocar as cobertas de lado e afundar o colchão, ao meu lado, com aquelas mãos geladas me abraçando lentamente, cuidando para não me acordar. E te espero dizer e te espero gritar e anunciar qualquer coisa que quebre o clima e os olhos vidrados no silêncio. E te espero chegar mesmo sabendo que nunca haverá surpresa, você sempre vai anunciar a chegada, o encontro programado e restrito demais para a amplitude dessa lucidez.
Te espero com ânsia para que julgues quem passa ao nosso lado, para que olhes os carros sujos de lama passarem na avenida, para que digas que haverá piquenique de vinho e de lembranças. Às vezes te espero e espero ver teu andar calmo e teu casaco costumeiro com aquele cheiro que eu inalo e logo me sinto viciada. Sou dependente. E te espero, mesmo que não venhas, mesmo que a tua presença não supra a necessidade que a loucura tem de te ter por perto. Te espero em bares, restaurantes, rodoviárias e no trem. Te espero sentada como uma criança comportada demais para quebrar as regras. Só que na verdade te espero porque quebrei essa regra. E ela não pode ser colada.

M.B.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Bêbada as coisas vinham, como um apetite grande demais para ser saciado lentamente. As palavras assumiam faces, implantavam cabelos, tinham pernas e braços distorcidos, gargalhavam no mesmo ritmo que o vento soprava e balançava os galhos das árvores. Bêbada e com a temperatura negativa, na rua, surgiam esperanças e neve e algumas expectativas que caíam como flocos na calçada gasta. Mas tudo durava apenas até a escuridão ser pisada com o primeiro sinal do dia. Bêbada, com a temperatura negativa e com as bochechas quentes e os dedos gelados, os sinos soavam como uma melodia doce demais para não ser enjoada. Mas os ruídos hipnotizavam a mente e os nervos assumiam vida, uma vida incapaz de ser destruída.
Levantava de madrugada e vomitava os sonhos, ora pesados ora com uma dose de culpa impossível de ser deletada totalmente. Nunca bons, nunca com cores, nunca com fatos leves para sorrirem. É que havia esquecido de escrever com o batom rosa, no espelho antigo e quadrado do quarto, que nem sempre a felicidade vem com o sol. Às vezes é a tempestade que protagoniza as danças de valsa.
Bêbada e infantil. Ela nesse estado que ela cantava as palavras perfeitas e gritava, em volta da lareira, futuros que não podiam se tecer sozinhos e nasceres de sol tão gastos que traduziam uma beleza quase suspeita: pontos de luminosidade no vazio azul aveludado do céu. História para criança ansiar. Mas estava na espessura fina do espelho, entre a realidade e a ilusão minuciosamente confeccionada, entre o pensamento de falar e o dizer quase pronto, entre a idade de desejar e a idade de desistir.

Nunca é demasiado tarde para se perder no reflexo borrado.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Casacos e falta de motivos.
Compreensões e navios.
Ausência também é presença.
Vazio também é preenchimento.

Gelo e caixas de madeira.
Sede e interpretações.
Branco também é cor.
Superfície também é profundidade.

Indiferença e malas furadas.
Arrogância e potes de bala.
Silêncio também é música.
Ilusão também é falta de razão.

terça-feira, 5 de julho de 2011

Olhou os olhos sem cor, apenas dois pequenos círculos sem graça, e notou a face branca, opaca, com umas sardas tortas querendo aparecer no sol. Era isso que fazia com que a tristeza invadisse as pálpebras e ali permanecesse. Os cabelos, lisos e gelados, não cobriam as orelhas miúdas e brancas. E questionou a sua realidade. E pensou que o menino moreno era mentira e que seu sorriso quase forçado também era invenção. As cores do céu também não tinham verdades, e as palavras, sempre pela metade, não queriam dizer nada, apenas soluçavam que o amor por vezes era sonhado e não havia corpo para ele. Só suspiro, suspiro inventado. Tudo de mentira, pensou. Apenas o pijama gasto deixando o pescoço à mostra. Longo e liso. A pele pura, ali, descoberta. E o frio queimando. Frio queima mais do que fogo. Tudo falso, acumulado dentro do armário de madeira escura que era a única coisa sólida do quarto. Sem passado nem presente nem futuro. Tudo era quase.

Quase um sopro gelado que percorre a nuca e vai devagar para o ouvido. Quase um pedido de clemência, uma voz rouca e baixa falando de cores. Quase um achar esperado, uma calma programada e um alívio soluçado. Quase um sorriso triste, mãos geladas nas cobertas quentes, uma espera que virou contenção e palavras que perderam o rumo.

Quase um desabafo.
Quase vidros estraçalhados.
Quase uma melancolia de sábado.
Quase um olhar calado.
Quase garrafas quebradas.
Quase amor de domingo.
Quase sonhos partidos.

Quase.

sábado, 2 de julho de 2011

A chuva cai, à noite
Folhas secas no asfalto
O ônibus passa por cima delas
Mas já estavam mortas, afinal