sexta-feira, 24 de abril de 2009

-O que tem sem carne? -eu pedia em alguma lanchonete.
-Ela não come carne. É que ela assistiu um vídeo uma vez sobre como matam os animais. -minha mãe cortava a moça que ia me dar as opções e explicava rapidamente.

É sempre assim em almoços de família, restaurantes, lanchonetes e até quando tem visita. Ela precisa explicar as minhas ações, precisa explicar o porquê de tudo, como se eu necessitasse de um tradutor. E o pior é que ela inventa essas explicações e acredita tanto nelas que pra ela acaba se tornando verdade. Sinto vergonha quando ela faz isso, mas ela faz isso porque sente vergonha de mim. Ela nota também que as pessoas me olham estranho de longe e me disse, certa vez, que eu não deveria usar as roupas que uso e que meu cabelo deveria ser mais normal. Sempre criticando. Diz que eu não posso ficar o dia inteiro de pijama e que não arrumar a cama é feio. Feio por quê? Eu não tenho tempo, ninguém entra no meu quarto e vou voltar a usá-la no mesmo dia. MAS CARALHO, EU ODEIO ALMOÇOS DE FAMÍLIA, NUNCA TENHO O QUE COMER!
Ela quer tudo do seu modo, quer que as coisas sejam padrões e dentro dos limites. Nunca me perguntaram se eu sou adotada porque sou parecida fisicamente com a minha mãe, mas talvez tenha passado pela cabeça que houve uma alteração no desenvolvimento dos embriões ou algo assim. E eu penso a mesma coisa.
Acontece que quando algo sai dos seus planos, ela abre a boca, grita e chora como uma criança pequena, não entendo o motivo. Ela explica as minhas escolhas, mas não consegue ver o erro das suas. E persiste nos erros, como se seus conceitos não pudessem estar errados.
A única coisa que temos em comum é a mente fechada, nada que falam muda o que pensamos. Mas eu não persisto nos erros. Persistir nos erros já é burrice.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Brega era não saber o que falava, o que pensava, o
próprio borrão dos seus atos. Brega era vomitar na saída do bar e ainda pisar em cima. Brega era seu sapato alto vermelho e seu colete azul apertado. Não sabia tomar chocolate quente no inverno porque se sujava e não gostava das árvores mortas no outono porque simplesmente eram mortas. Não era ninguém, mas sabia o que havia sido um dia. Não era ninguém e era amargurante ter essa consciência. É muito pior quando se sabe das coisas. E ela sabia, mais do que qualquer outra pessoa. Era nada e se arrependia de um dia ter desejado ardentemente isso. Corria dos ponteiros do relógio porque eles lhe tapavam a mente. Por isso nunca tinha horário pra nada. Ela e a solidão. Ela, a solidão e a vodca. Sentava no bar assim que acordava e passava o dia esperando que algo acontecesse. Nunca acontecia. Mas ela não sentia tristeza, essa não debatia-se mais com tanta força dentro de si. Era nada e que doçura ver a sua imagem emoldurada na parede manchada. Era nada.

-Todos os outros também são.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Olha só como ela se move e grita palavras fúteis. Olha seus ombros a mostra quando o frio cobre a cidade de branco. Ela quer mostrar seu corpo magro e cheio de merda como todos os outros. Ela quer chamar a atenção e tudo o que consegue são olhares de rejeição. Eu apóio, mas eu apóio a rejeição. Olha só, olha só... olha seus olhos brilhando quando conta um caso sem importância e dramatiza e faz gestos, e sorri quando todos estão com raiva. Olha sua mente vazia digna de pena e seus dedos com unhas bem feitas e seus amores que não passaram de meros estranhos. O nome disso é... o nome disso é:

isso não tem nome mas é o mais comum do que diz ser sociedade. O pior ainda não é isso. O pior são as pessoas que escrevem e dizem em palavras bem complexas que priorizam o interior e não julgam ninguém e aí no outro dia lá estão elas em grupos pequenos falando mal do sapato furado do cara engraçado. Oh, maldita sociedade com garras de aço.