terça-feira, 30 de setembro de 2014


Querida Lissa,
a cidade está terrivelmente calma. Nenhum assassinato. Nem acidente. Nenhum ganhador da mega-sena. A chuva cai fininha. Fui ao mercado somente para poder andar um pouco mais pela noite. Dilma avança nas pesquisas. Minha família vai votar no Aécio. São burgueses demais. Aliás, mamãe escreveu hoje. Lá também chove. Hoje a chuva me faz feliz. A primeira coisa que fiz quando cheguei em casa foi pegar uma taça de vinho. Coloquei flores pela casa e acendi uma vela. Gosto dessa luz clarinha, uma chama no meio da escuridão. Nada me é tão aliviante como o pensamento de ter meia garrafa de um vinho bom na geladeira.
Enquanto voltava do mercado, pensei em te mandar uma reportagem sobre o Cortázar que saiu na Piauí do mês passado. Vou aproveitar e mandar o quadro que pintei para você. E uma carta batida à máquina. Mas não vai ser amanhã. Amanhã vão trocar o encanamento do banheiro. Vai levar um tempo. A casa toda definha. Mas está limpa. Pela primeira em anos consigo deixá-la aconchegante e arrumada. Separei uma pilha de livros pra ler. Também devo fazer meu projeto de mestrado na próxima semana. Nunca pensei que escolheria fazer mestrado. Nunca pensei tantas coisas que estou sendo. E que estou querendo ser. No fundo, estamos no mesmo caminho. Você aí, eu aqui. Com uma ou outra diferença. Acho que nos veremos em breve. Uma hora ou outra o caminho vai ficar mais estreito. 

Por favor, mande-me o seu endereço quando puder. Acabei perdendo-o em meio aos papéis. Também me mande notícias.

Com amor,
M. Batata

quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Diário de personagens

Não vem. Nem em cor. Nem em preto e branco. Nem em retrato. Nem escrito. Acho que ter vestido aquela capa amarela, no final de semana, me deu a possibilidade de ser a personagem criada há alguns anos. E tendo sido ela, achei que poderia ser outras. Que pelo menos se aquilo não vinha, eu podia brincar com a vida e ser o que quisesse.


Por isso que ontem eu acordei e decidi ser bailarina. E sendo, qualquer outro desejo, expectativa ou falta é eliminado do peito. Depois de pensar que seria bailarina, disse. E dizer é o registro absoluto. Não se pode mais voltar atrás depois que as palavras saem da boca. É necessário ser fiel a elas. 

E ser bailarina é quase como ser nada. Acho que serei leve outra vez, ainda que o peso do meu próprio corpo diga o contrário. Serei. Não qualquer coisa. Serei bailarina. E depois de decidir o que seria, achei que devia comprar uma garrafa de vinho para comemorar. Mas bailarinas não bebem, logo me corrigi. E voltei pra casa na ponta dos pés, sóbria, e quase já sendo.

sábado, 20 de setembro de 2014

Tá doendo mais porque é pouco tempo, mas doo sorrindo.

Hoje não é você e não sou eu e todas as estradas não me levaram até aí. 
E eu quis cair só para ficar no chão, sem ter mais fundo pra me fundir. 


segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Pensei que escrever era uma forma de gritar em linhas retas; não tão grave, não tão agudo. Mas agora que não falo, que não grito... ah, também não escrevo. É esse o "estar para dentro": o silêncio de mim em mim mesma. Tenho medo de nunca mais voltar a gritar.
Eu digo "fim"
A vida me diz "continua"

Não sei que diabos isso significa