sexta-feira, 2 de setembro de 2016

Das outras que vivem em mim

Aos 11 anos eu descobri que podia ser qualquer coisa. Eu ficava sozinha em casa à tarde e era livre pra fazer o que quisesse. Então eu juntava roupas da minha mãe, minha tia e minha vó para criar personagens. Eu era Maria, Rosa, Amélia. Vivia na década de 1930, 1980, 1970. Falava vários idiomas (inventados). Na sala, eu montava todos os cenários possíveis. Na mente, todas as personagens possíveis. Foi assim que eu vi quantas possibilidades cabiam no meu peito. E decidi que nunca na minha vida seria uma coisa só. Mas que seria, principalmente, a soma de tudo. 

Quando eu tinha uns 15 anos, uma amiga disse que eu parecia um camaleão, pois me adaptava a qualquer pessoa. Na hora, não pensei em dizer que ser um camaleão era bom. Não disse porque esse segredo era só meu - e não me importava se as pessoas viam com maus olhos o fato de eu poder ser quantas pessoas quisesse. 

De fato, nunca mais fui uma coisa só. É verdade também que não fui mais tantos personagens. Só alguns sobreviveram nessa vida adulta. Mas os que ainda existem, existem com uma intensidade absurda. Gosto mais de ser Maria. Mas não posso ser Maria no trabalho. Então, no trabalho, sou Thaís. Mas não a mesma Thaís que sou para meus familiares. Nem para os amigos. Muito menos para os desconhecidos. 

Meu peito ainda é cheio de possibilidades. E são essas possibilidades que matam as neuroses de Maria. Ser Maria mata a timidez de Thaís. E é só mantendo todas essas pessoas vivas que eu, como unidade, consigo me manter viva.