terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Notes from the couch XXVI

Já não sei mais o que foi que escrevi, se fui eu que escrevi, o que deixei de escrever e o que inventei ou realmente aconteceu. Já não sei mais quem. Não quem sou, nem quem fui. Mas quem. Não sei dos sonhos, das realidades costuradas em cima dessa cama quente, das realidades estraçalhadas em cima dessa cama quente, das manchas dos lençóis, das manchas que poderiam ter existido, mas não existiram. Já não sei mais o antes. Nunca o depois, jamais o depois. Mas não saber o antes é como estar no alto de uma ponte de dois centímetros, o corpo leve, os pés nus, sem machucado algum, esperando pelo momento de sentir o vento embaraçando os cabelos. Acho que nunca fui, embora muita coisa tenha acontecido e várias vezes reconstruí a cena, os olhos, o nariz, os ouvidos. Os finais. Só para poder fechar o livro com a consciência leve. Leve a minha consciência, tantas vezes eu disse. Mas nunca levaram. Nem eu mesma fui capaz de lavar. Tudo o que eu fiz foi inventar. E é por isso que já nem sei mais o que foi que escrevi.