terça-feira, 10 de setembro de 2013

Notes from the couch XIII

Desculpe-me pelas garrafas de cerveja pela casa. Principalmente por estas que estão em cima da mesa e se misturam aos papéis com a minha letra indecifrável. Desculpe-me pela poeira atrás da porta e pela bagunça na cozinha. Quando estou sozinha, finjo que ela não existe. 
Desculpe-me por conversar com o quadro do Bukowski e por conversar sozinha no banho também. Por fazer uma paródia em cima da música A Casa, do Vinicius de Moraes. Desculpe-me pelo silêncio e pelo excesso de vinho. Por dormir tarde. Pela insônia. Pelos motivos nulos. Pelos pesadelos. E por me comprimir nesse mundo, cada vez mais, como se fosse um útero.
Às vezes acho que é isso: que estou em um útero, mas que há muito era a minha hora de nascer. Esqueceram de fazer o parto. Esqueceram que havia gente. Eu grito “hey, estou aqui, olhe para mim”, mas meu grito ecoa no vazio, no vazio que cabe nesse espaço apertado onde me acomodo.
Às vezes faz frio à noite. Faz frio e é escuro. Só três cobertas me protegem do inverno. Três cobertas e essa placenta de madeira que deixa o vento passar pelas frestas. A placenta é velha. Talvez eu esteja no útero de uma pessoa que já morreu. Enterraram, ela e a mim. Não ouviram meu coração. Logo ele, que pulsa com tanta força que quase rasga o peito. Sentiram a minha pele fria. Como, eu não sei. Mas sentiram. E julgaram que eu estava falecida. Estava desfalecida, eu. E fiquei desfalecida aqui dentro, nesse mundo que pinto e contorno, como se fosse uma cabana de papel.