sexta-feira, 12 de abril de 2013

Notes from the couch V

Sirenes, buzinas, o som do ônibus que nunca para. Gostaria de poder descrevê-lo. Mas há tanto que ele está na minha cabeça que nem sei mais como é o próprio silêncio.
Gritos no meio da madrugada, risadas, o choro que irrompe no começo da manhã, e não é o meu, amor. Não sei de quem é. Dói mais o que não se sabe de onde vem, porque é perdido, porque se perde nos primeiros azuis claros do céu. Porque se perde quando chove e quando o tempo é uma incógnita que se transforma em surpresa ao longo da rotina.
O balanço das curvas dentro do vagão, os braços e pernas sufocando, as vozes exaltando a irritação, e de tanto que é exaltada acaba em água salgada, que escorre até a ponta nariz, cai dentro da boca e se mistura com saliva. E não é mar, amor.
Cigarros, histórias que se desenham nas esquinas da noite, saudade que em vão eu tento apunhalar, uma fuga que eu não chamo. Clamo. Aspiro um ar que não é meu, todo com cor sem tom, desmaiada, desbotada, e suspiro uma exaustão que não sai em som.
Não quero a rima. E ela vem. Reprimida. Com gosto de cerveja, de cansaço, de estrago. Quando quero, não vem. Forço para achar significado onde o que transborda é a ausência.
Acho que caminho dentro da noite, mas é ela quem caminha dentro de mim. Pisa firme, como se a cada passo pudesse cair, como se o chão fosse maleável, fino, em líquido. Não me deixa dormir. Ouço a sua tentativa de ficar viva, de ser ao menos sobrevivida. Mas quem sobrevive sou eu.
A luz da lamparina queima meus olhos. E cai alguma coisa lá embaixo, um ruído seco ao chegar ao chão. Ninguém grita. É hora de não gritar, de não questionar, de se colocar a par de si mesmo. É hora de não ser.
Recolho o caos, os cacos, os casos pela casa. Encontro a loucura embaixo da cama, com sorriso de menina travessa, os olhos suplicando para que eu não a coloque para fora. Como posso... se chove? Como posso... se ela se dilui em reticências, no lençol branco da cama, e se queima, e eu trago?
 
Quebrei o copo de vidro. Rabisquei o aturdido. Sobrou o cheio. E ficou sem ar. E fiquei sem mar. De novo.