domingo, 30 de setembro de 2012

Querida Natasha,

a mala está quase pronta e não consegui colocar dentro dela nem metade do que eu queria levar. Sempre imaginei esse momento, mesmo que não de forma tão bonita. Mas em todos os meus pensamentos a quantidade de coisas levadas se resumia a uma mala. E por levar tão pouco sinto como se fosse fazer uma viagem. Então não considero isso como uma mudança, ainda que seja. Ontem a minha avó perguntou quantos meses eu ficarei fora. Foi aí que eu percebi que quase ninguém está encarando isso como realmente é, exceto a minha mãe. E quando respondi 'talvez nunca' fiquei tão surpresa quanto ela.
É estranho porque sempre atribuí às minhas personagens esse tipo de história. Era como se eu jamais tivesse a chance de sair daqui, tão presa que me sentia, atada à minha própria solidão que, se ferida, abriria ainda mais o caos que provoquei. E agora, por mais que a palavra solidão realmente seja predominante, não me sinto só. Ao contrário, sinto-me livre. Não apenas daqueles casos, mas também de mim. Desse 'eu' que construí e que te narrei em parágrafos curtos. Desse 'eu' que inventei, que inventamos.
Não sei até quando me sentirei livre, claro que não sei. Mas estou tão afundada no presente que não me preocupo com o próximo passo. Realmente não me preocupo. E foi por não me afligir que tudo se construiu assim. E digo 'se construiu' porque quase não influenciei os fatos, porque não os provoquei. Pergunto-me se é isto que nos move, literalmente: a falta de interesse. E por que não?
Por enquanto sou nômade, e esta palavra nunca me soou tão bonita. Vou encontrar a minha casa com jardim, mesmo que eu esqueça de regar as plantas. Vou encontrar uma varanda ensolarada e uma cozinha azul. E depois te contarei tudo, em frases rápidas ou em cartas longas.

Não esqueça de me escrever.

Com carinho,
Thaís