quinta-feira, 23 de agosto de 2012

(ela)
Não escovou os dentes para deixar o gosto de cerveja na boca, aquele bafo que não suportava em ninguém, aquela sede que impedia qualquer outro pensamento. Concentrava tudo apenas nos lábios secos, no estômago sentindo o excesso de álcool, reivindicando paz com ruídos estridentes, e na dor de cabeça que não se extinguia. Distraia-se de si mesma para não cair em seu próprio jogo, acreditar nas suas próprias mentiras, não sabendo se o cenário era puramente ficção ou se fazia parte disso que encravara em sua pele: a realidade bruta. Agitada, ela perdia os fatos que esquecia de viver. Agitada, ela já não sabia se ele existia, de fato, ou se era um ser criado pela sua mente.

(ele)
Preparou um café forte e deixou a xícara em cima da escrivaninha, enquanto a tela do computador ficava branca e o cursor de texto piscava. Aquilo era silêncio, não vazio. Não havia nada de novo para ser escrito, nada que já não tivesse colocado em frases. Não saíam, as palavras. Não saíam e os olhos não se fechavam com força na esperança de que surgisse alguma luz na escuridão. Não saíam e ele permanecia em frente ao computador, o café já totalmente frio e o braço direito dormente, não sabendo e não querendo saber o que aconteceria em seguida, se aconteceria algo em seguida. Mas nunca criava ela.