quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Querida Natasha,

acho que nos desconstruímos em várias faces, sabe? Talvez eu conheça apenas uma de você, uma que nem você acredita possuir. Afinal, todos somos frios em alguma situação. Todos temos autocontrole, mesmo que ele nunca seja usado. E você deixa escapar, ainda que não consiga ver. Ou eu vejo errado - o que é mais provável. É que construímos uma imagem de nós mesmos e acreditamos cegamente nela. Não podemos admitir haver outra possibilidade. Essa coisa de criar antes de viver acontece comigo também. Só que passou dos limites, sabe. Estou em um ponto em que crio os personagens e quero vivê-los, mesmo sabendo o final das histórias. Isso é quase suicídio.
Se o vizinho de mesa de bar deixa o cigarro cair, imagino a história dele e quero incorporá-la. Muitas vezes os elementos passam de um simples cigarro e já são trechos (verdadeiros) das próprias tramas. O erro é por no papel, dar mais cor do que realmente tem, realçar um sentimento, uma fala. É isso que chamo de loucura. Porque a gente não nota, tudo isso é muito inconsciente. Mas somos culpados.
Minhas costas doem, agora. Estou tonta porque bebi café demais e provavelmente meu peito vai doer também se eu finalizar o dia com cerveja, o que é bem provável. A verdade é que estou tentando me manter afastada destas histórias, como dá para perceber no blog. A ausência de terceira pessoa é constante, o que, devo mencionar, me deixa triste. É sempre mais fácil colocar os fatos em alguma outra personagem.
As quintas sempre são cansativas. Também porque é quase final da semana, mas principalmente porque é o dia mais corrido no trabalho - mesmo que hoje tenha sido mais calmo. É sempre difícil levantar da cama de manhã cedo, o que me fez ficar meia hora a mais nela hoje, acordar com uma música horrível na cabeça, não tomar café da manhã e correr para pegar o ônibus na esquina de casa. Ontem terminei de ler Os Cães Ladram, do Capote. Foi um parto acabar, acredite. Hoje decidi ler quadrinhos. Preciso de uma leveza nos dias que não ando encontrando em qualquer lugar. E os livros me dão essa possibilidade.
A primeira coisa que faço ao chegar no trabalho é encher a minha xícara de café. Ela é grande, azul, e tem uma vaca estampada - adoro vacas. Depois abro os meus e-mails e todas aquelas coisas que as pessoas costumam fazer antes de "começar o dia". O meu problema com a manhã e com a tarde é o excesso de sono. Estou sempre adormecendo. Estou sempre me arrastando para onde quer que eu caminhe. E quando o café me acorda, fico tonta. Fico tão tonta que erro as palavras, quando digito, e, ao revisar, não noto. Talvez aqui tenha vários erros. Não vou perceber. O problema é que meu trabalho é escrever.
O almoço me parece a cena mais decadente do dia. Espero na fila, em um restaurante, para me servir. Depois espero até que tenha alguma mesma disponível e me sento para comer cenoura, brócolis, arroz, peixe, morangos e abacaxi. Sempre perco o apetite ao me sentar. Primeiro porque a televisão fica ligada e o volume é alto demais, segundo porque aqueles murmúrios de todas aquelas pessoas me deixam irritada. Então volto para o trabalho, escovo os dentes e logo me sirvo de outra xícara de café para que o sono (duplicado depois do almoço) se dissipe. É inútil.
Por isso que acabei bebendo demais. E agora estou zonza. O problema de estar assim é que faço as coisas sem pensar, vai tudo no impulso, sabe? Como quando você espera uma ligação e ela não chega. Aí você resolve se adiantar, certo?
Agora vou ver a tarde morrer, da janela do ônibus, enquanto vou para mais uma aula. Espero sair viva da noite. E sair viva nem sempre está ligado a tentar me manter longe do bar. Talvez eu simplesmente fuja da aula e me esconda em algum lugar onde possa escrever, imaginar histórias que não são minhas, imaginar o seu dia, a sua história, e depois transformar tudo em realidade.

Aposto que o seu dia foi mais interessante que o meu. Sabe quando todos parecem ser?

P.s: acho que o seu significado de 'detalhe' não é o mesmo que o meu. Espero que você me desculpe.

Com carinho,
Thaís