segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Querida,

liguei ontem para você para saber como as coisas estão por aí, sem mim. Você disse que nevou durante uma semana. Nunca tinha nevado comigo aí, nessa cidade pequena. Já faz cinco anos que não retorno. O meu braço direito está pior a cada dia e todas as vezes que telefono para minha mãe ela reclama e diz que fui uma filha ingrata por ter ido embora sem avisar ninguém e sem motivos aparentes. Ora, mãe, você devia ter sido a primeira a saber que na minha vida a palavra motivo nunca teve relevância.
Não perguntei se você está namorando. E você não disse. Lembrei das vezes em que conversávamos para não sair da rotina e você me contava novidades que eu não pedia. Você continua mudando e eu não lamento mais, não como lamentava uma vez. Tá quente demais aqui. O calor deixa o corpo mole mas nos transforma em pessoas mais duras, mentalmente. Aprendi a dizer não e a ser menos sentimental. Você não entenderia isso. Os meus peixes morrem rapidamente e faz uma semana que o aquário está vazio. Acho que desisti de ter vida em casa, constantemente.
Estou com saudade da neném que agora nem é mais tão pequena assim. Chegou aos seus oito anos. Ela é a única que me faz sentir saudades. Você, querida, nem sei mais como é o seu físico. Evito ver as suas fotos na internet e penso menos em ti com o passar do tempo. É difícil fazer isso quando fiquei tanto tempo presa à ti. Você era uma das muitas pessoas que não acreditava que eu largaria tudo, aí, e viria. Sempre pensou que eu fosse apegada às pessoas e aos domingos no parque. Nunca soube, realmente, o que brilhava fundo em mim.

Agora eu me despeço, aqui, nesta carta que você nunca lerá; não conscientemente.
Adeus. Seu sorriso há tempos deixou de me fazer feliz.