sábado, 16 de novembro de 2013

Dois pontos, letra minúscula

Eu devia ter avisado-a naquela vez, em frente ao portão de casa, na nossa despedida, que é fácil se perder. E que não é somente fácil, como repetitivo. Depois que se perde a primeira vez, torna a perder-se repetidas vezes, tantas que o estômago revira-se em protesto. Perdida, ela já não poderia fazer ou dizer qualquer coisa. É por isso que silencia. Mas eu não disse. Senti a boca seca e as frases desconexas. Pensei ser um falso pressentimento. Não era.

Perdido, o coração estufa o peito. É grande e pesado. Frágil. Bate descompassado. Tem espasmos. Dança. Se revira. Quer espaço. Não tem. E ela desconhece a situação do seu pobre coração. Acha que é porque bebeu muita cerveja. Não sabe que está perdida. Que sempre estará. Que esta é a sua condição. Está fadada a perder-se até o final da sua vida. E quem sabe também depois.