segunda-feira, 27 de agosto de 2012


"Eu também ficaria impaciente se outra pessoa me falasse dessa maneira, mas há dias em que. Sim, dias. E noites." Cortázar


Tira o pó dos livros, pega a prancheta de pintura e colore, mesmo que de preto, os desenhos que você não fez. Cria uma nova seleção de músicas, de tempo, de dias. Desfaz essa gaveta desarrumada, menina, e começa a dobrar as camisetas do pijama novamente. Descola esses recortes de revista que você fixou na parede e tira as manchas de barro no sapato vermelho. Limpa a chuva da janela embaçada e desembaça as frases. Parafraseia os pesadelos que não gritam mais, apenas dão play quando os olhos se fecham e não pausam quando eles tornam a se abrir. Para de justificar tudo com a loucura. Ela não te espera mais no portão nem deita ao seu lado na cama.
Coloca essas botas de chuva e finge que a neblina que cai no teu casaco preto não está tentando te congelar por dentro. Vai, coloca esse cachecol, aumenta o volume de Nina e esquece esse passado que você criou. Deixa o frio adormecer o rosto. Deixa a chuva anestesiar a angústia. Abre esses olhos para o dia cinza e procura as cores escondidas nas esquinas. Elas estão lá, menina, mas você precisa querer ver. Não fraqueja agora, no último degrau para sair da ponte, no limite para abandonar o caos. Não olha para trás. A sinaleira está fechada e aqueles olhos te veem do outro lado, mesmo que imaginados.