quinta-feira, 22 de março de 2012


Sempre esquecia que o ônibus das 19h30min não passava na parada dos trilhos, mas tornava a ir esperá-lo, uma vez por semana, praguejando quinze minutos depois quando percebia que havia perdido. Não naquele final de tarde. Deu de ombros ao vê-lo passar do outro lado da rua, aumentou o volume do ipod e saiu caminhando, os pés quentes sendo apertados pelos sapatos novos que faziam as bolhas surgirem rapidamente. Havia uma espécie de delírio, um sentimento reprimido, tantos pensamentos se misturando que ela dizia mentalmente: não estou pensando, estou imaginando pessoas, imaginando falas, mas imaginando a realidade.
Cogitou passar no mercado e comprar duas latas de cerveja, como ela costumava fazer quando estava com ele. Não, não naquele dia. Preferia imaginar do que lembrar. Imaginar fazia com que os sentimentos fossem neutros. Lembrar significava ficar nostálgica e chata. Os pés pisavam tortos na calçada, reclamando da dor que ela rejeitava. Os pés andavam tortos, lentamente, enquanto seis pássaros passavam acima do sol, que tentava sumir. Os olhos dela não viam. Estava embriagada sem estar bêbada, pensando não estar pensando, sabendo que o sol ampliaria a quantidade de sardas no rosto, mas não se importando.