sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

O vento podia mudar o que os dias jamais puderam.

A aquarela no aquário que move o peixe e o feixe de luz que entra pela vidraça do sótão. O peixe nada de um lado pro outro, esperando o próximo segundo, esperando que alguma coisa mude sua vida ou lhe deixe realmente vivo. Mas a luz é a única vida além dele naquele sótão e ele não pode falar e ele não pode gritar e ele não pode cantar. A única coisa que ele possui é uma excessiva solidão, muito maior do que seu próprio lar, muito maior do que uma casa ou um prédio de vinte e dois andares. A solidão pode não ter fim. A solidão pode ser amiga ou inimiga, depende como você a trata e como você lida com isso. Mas o peixe se alimenta dela, o peixe respira ela, bebe dela, dorme nela. O peixe é parte da solidão tanto como a solidão é parte dele.
Um dia acordou e viu a água do aquário ficando rosa. Demorou até descobrir que era seu próprio sangue. Seus olhos fixaram uma nuvem, uma nuvem tão silenciosa e agitada que ele pensou ser a morte. Sim, era ela. Sufocou-o e o esfaqueou sem pena, sem maldade e sem prazer. Ela era assim, apenas a vírgula de uma vida que vez ou outra se tornava o fim. Sem face, cor ou cheiro.


"Quanto a mim, assumo a minha solidão. Que às vezes se extasia como diante de fogos de artifício. Sou só e tenho que viver uma certa glória íntima que na solidão pode se tornar dor. E a dor, silêncio." Lispector