domingo, 16 de novembro de 2014

Notes from the couch XXXV

Fico pensando se desde o começo foi assim, esse desatar de nós no final da manhã de um domingo de novembro, nossas mentes nuas, completamente sóbrias, flutuando no lençol branco que não fora trocado no dia anterior. Se essa fronha listrada sempre foi desbotada ou se houve alguma época em que ela era nova e as cores mais vivas. Se esse meio de novembro sempre foi mais alívio do que caos e se havia pássaros cantando durante a madrugada. 
Dona Maria foi embora na semana passada. E desde o começo era ela no 301, seu silêncio se arrastando pelo corredor limpo, só sendo quebrado pelo som da televisão nas noites de domingo. Antes era Maria, agora é Pietro, embora a minha mente se confunda e continue o chamando de Pablo. Junto com Maria foram seus panos engomados e aquela sensação de amparo, de que era na porta da frente que eu poderia pedir uma xícara de açúcar  e agora, justo agora, realmente me falta açúcar —, mas eu nunca pedi. 
Não lembro se o antes foi igual ao agora, ou se, como Maria, o antes foi embora para dar lugar a outro inquilino. Não lembro se os pesadelos eram os mesmos ou se havia reforma no apartamento ao lado. Talvez sempre tenha sido 11h21min de domingo. Talvez sempre. Talvez nunca. Talvez o rádio de pilhas ligado e o som inconfundível de Miles Davis inundando o quarto quente e úmido. Talvez você de camiseta amarela me fazendo lembrar da cerveja na geladeira. E desse espaço do domingo que poderemos preencher como todos os outros, ou como este, unicamente este.