sexta-feira, 9 de março de 2012

Barbas Tortas, 8 de março de 2012

Querida Lissa,

hoje lembrei de quando você disse que eu estava começando a gostar das cores. Não sei se o verbo certo é esse. Os dias têm amanhecido cinza, depois se transformam em azul, verde, laranja e, no final da noite, viram um borrão sem cor e tudo é afogado naquele copo com líquido dourado, que também acaba morrendo dentro de mim e se transformando em uma melancolia impossível de se dissipar. O que eu quero te dizer, e que tem a ver com isso, é que no primeiro dia do ano eu pensei que realmente poderíamos reconstruir o barco, dessa vez mais forte. Que pensamento otimista, o meu. Ou devo dizer esperança? É que barcos de papel nunca deixarão de ser barcos de papel. E você sabe que estaria tudo bem se não fossem as tempestades.
Eu te disse que deveríamos remar juntas, não desistir, mas vejo como eu estava enganada. Meus braços doem, literalmente. Não é algo que fica impregnado nos sonhos acordados de noites insones. Também não sei há quanto tempo eles doem. É por isso que eu tenho pensado em largar os remos na água. Se os largasse, não iria junto para o mar. Estou cansada demais para isso. Quero deitar no chão do barco, fechar os olhos, ouvir a água batendo na parte de fora, de papel, e tentar não enjoar com o balanço abrupto. Juro que pensei em outras possibilidades, mas talvez eu não seja criativa o suficiente. Você sabe que eu tenho tentado. Aliás, nos últimos meses "tentativa" foi o que mais houve, logo para mim que deixava tudo ocorrer sem me importar. Acontece que nem sempre os fatos, os sentimentos e o os mundos, que se instalam no peito, dependem de nós.
Ao mesmo tempo, quando penso em largar os remos, sinto-me egoísta. Não quero te deixar remando sozinha e também não quero que você largue os remos, mesmo que seja para deitar ao meu lado, fechar os olhos e sentir tudo balançando. É por isso que te pergunto o que é que devemos fazer, logo nós que não escolhemos o barco, o mar, as chuvas e as tempestades.

Com carinho,

senhora M. Batata